domingo, 22 de outubro de 2017

A Matuta Nordestina, de Maria José da Silva


 O destino vadio com sua sorte, era filha de pais pobres, além disso, o pai analfabeto, a mãe ler escrever e até falar guarani, língua indígena, mas sabia costurar como ninguém, bordar e também fazer comidas nordestinas.

Também sabia fazer rendas e tecer algodão para fazer roupas grosseiras como as de antigamente, sabia fazer partos, bonecas e bruxas e Judas nos Sábados de Aleluia, como eram os costumes de antigamente.

A matuta nordestina não entendia porque eles se mudavam tanto de lugar de gente diferente, como fazenda no Paraná, Mato Grosso e São Paulo. Oxente! Bem dava para aprender falar do jeito do lugar, mas a matuta prestava atenção nas palavras e nos nomes de cidade ou vilarejos: Guataporanga,  Lourdes, Terra Rica-PR, Adamantina. E de fazenda em fazenda, nos anos 60.

Para a matuta foi um pulo de grandeza de roceira, passou a ser arrumadeira numa mansão e conheceu os desfiles e 7 de Setembro, carnaval de rua e as ruas enfeitadas de dia de Corpo de Christi.

Naquele tempo as domésticas buscavam latão de leite na estação de trem que trazia das fazendas. Vixe! Era um orgulho ir na estação com a bicicleta da filha da patroa. Oxente, como eu já tinha prestígio!

Assim esta senhora de meia idade me recebeu com os braços aberto e colo aconchegante, pois ainda não tinha prédios, a escola Lopes Borges e nem a 600 casas. Não havia tantas UBS, mas ja havia muitos médicos bons e a melhor condução que havia na cidade era o trem.

Portanto, agradeço a você Araçatuba e todos e a todos que contribuíram para sua evolução e sucesso nesses seus 108 anos.


*Maria José da Silva, membro do Grupo Experimental, escritora, pratica a “literatura naif”, com acompanhamento de um outro escritor, como aconteceu com Carolina de Jesus e jornalista Adáulio Dantas.

sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Os ipês voltaram das férias

Foto de Ângelo Cardoso
Hélio Consolaro*


Araçatuba começou a florir, está roxa, é inverno, são férias escolares, os ipês soltam seus cachos. É momento de aconchego debaixo das cobertas, de as avós receberem seus netos.

Essas árvores, símbolo do Brasil, se parecem com aquelas mocinhas magricelas que de repente se tornam torneadas, com suas curvas sensuais, com suas flores lindas. Ambas enfeitam a cidade.

Não importa que os ipês não sejam como os oitis que dão sombras o ano inteiro ao caminhante, mas não florescem. Aliás, os ipês só dão proteção depois de derrubados, com sua madeira resistente.

Na flora, eles deixam os araçatubenses alegres, românticos, orgulhosos de sua cidade. Enquanto ficam descansando, sem folhas e flores, vivemos de suas fotografias.    

Nesta época, a cidade fica primeiro roxa, depois rosa, em seguida amarela e, por último, branca. Se você caro leitor, ainda não tirou os olhos dos boletos bancários, nem reparou o colorido de nossas ruas, ainda há tempo de fazê-lo, até novembro.

Viaje pela vida, não tenha pressa de chegar, a nossa passagem por este planeta é breve, porque de repente você não saberá contar a seus futuros amigos da outra dimensão como era a sua cidade.

Abençoadas mãos que plantaram os ipês de nossa cidade, desde quem planejou o plantio até quem fez a cova, enfiou a muda e deu a primeira aguada.

*Hélio Consolaro é professor, jornalista, escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras 

terça-feira, 25 de julho de 2017

Do Jardim Nova Iorque aos condomínios


Condomínio de Araçatuba-SP - foto de propaganda do empreendimento

Hélio Consolaro*
Meus avós chegaram a Araçatuba no começo da cidade, o município foi o berço de meus pais e meu também. Minha mãe, com 90 anos atualmente, passa pela praça Rui Barbosa e se lembra do sistema de alto-falante do Dante Conti. E Dona Augusta não se cansa de contar do antigamente. Alguém já disse que a morte de um velho é o mesmo que colocar fogo numa biblioteca.

Vi o Jardim Nova Iorque surgir, cujo slogan da propaganda de loteamento era "valorização absoluta". Os mais ricos construíam do lado direito da avenida Brasília (indo para a rodovia Marechal Rondon) as suas mansões. Assim ficou a fama, a pecha, de que era o bairro dos tubarões. Se quisesse chamar alguém de ricaço, era dizer que era morador do Jardim Nova Iorque. Houve até gente que comia sanduíche de mortadela, mas arrotava peru, para se mudar ao bairro.   
Cartaz do filme

Ter um bairro assim não é privilégio de Araçatuba, porque a mania de grandeza, de ostentação do ser humano, de não querer se misturar, se manifesta em qualquer lugar, na hora de matricular os filhos na escola e até no cemitério. Mas os ventos da pobreza, produzida pela perversidade do próprio sistema econômico, como a areia do deserto não respeita o oásis. 

E os moradores do Jardim Nova Iorque perceberam isso e correm para os condomínios, horizontais e verticais. Temos arranha-céus em Araçatuba com um apartamento por andar. Atualmente, as casas do bairro estão se transformando em sedes de sindicatos e empresas.

Outro dia visitei um condomínio horizontal em Araçatuba de classe média baixa, bem longíquo, com algumas ruas quase intransitáveis de tão estreitas, mas com portal, porteiro, etc. Imitando os grandes condomínios. Uma forma que as construtoras encontraram para explorar a vaidade dos pobres. Hoje, Araçatuba tem escritórios especializados em prestar assessoria para diretorias de condomínios.

Não por acaso, no Brasil, o primeiro condomínio recebeu o nome de um filme, Alphaville (1965), do francês Jean-Luc Godard, filme de ficção-científica, feito em preto e branco por opção.

Temática parecida com o livro de George Orwell em "1984"; do filme "2001: Uma odisseia no espaço", de Stanley Kubrick. O filme "Alphaville" é o  "controle social alegorizado mesclando a selvageria do capitalismo ao dogmatismo comunista".

O filme foi feito numa época de conflito mundial bipolar, falava-se muito de guerra nuclear, Alphaville é o reduto do medo, onde um computador dava proteção total, o Alpha 60, daí Alphaville ser a "cidade de Alpha". As pessoas eram protegidas, mas perdiam os sentimentos, havia um mandante impessoal, tanto é que o maior inimigo da máquina era a poesia. Os versos eram o antídoto.  

Os filósofos brasileiros cunharam uma expressão chamada "a lógica do condomínio" que representa o enredo do filme Alphaville, ou seja, a fuga do desconforto da cidade, o medo da violência, em vez de encarar coletivamente a reconstrução das cidades. Mas nessa tentativa de construir uma ilha perfeita, com proteção pretensamente total,  os moradores se tornam reféns das imperfeições de si mesmos, porque são também humanos.      

Não vou afirmar que nunca morarei num condomínio, porque estou entrando numa fase da vida em que se perde paulatinamente a autonomia de administrar o próprio destino. 

Meus filhos, casados, com família, nunca manifestaram o desejo de morar em condomínio. Deve ser uma questão educacional, por osmose. O meu condomínio é o quarteirão de minha casa, onde convive gente de todos os tipos e todos se relacionam como podem.

*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Um blog querendo ser livro

Um projeto para compor um blog de textos sobre Araçatuba que pode se transformar em livros
Foto de Araçatuba - Ângelo Cardoso

OUÇA A MÚSICA LUZES DE ARAÇATUBA, DE MAGNO MARTINS, CLICANDO AQUI
Araçaletras - um blog querendo ser livro

Hélio Consolaro*

Você, que mora em Araçatuba, escreve literariamente, então, pode participar deste projeto, mandando um texto para mim, que sou o editor dele: Hélio Consolaro, conselio@gmail.com.

Se você nasceu aqui e está fora, pode participar também; se você morou no município por um bom período, terá o direito de participar também. 

O autor pode ser falecido, como há no blog um poema de Clóvis de Arruda Campos.

O objetivo é editar um livro com os textos, com lançamento na semana do aniversário do município em 02/12/2017 - 109 anos.  

Enquanto secretário municipal de Cultura, fizemos até um edital do Fundo Municipal de Apoio à Cultura, premiando o melhor projeto com este caráter, mas não houve quem se candidatasse. E como secretário estávamos impedido de participar. Agora, fora da secretaria, com mais tempo, desembaraçado das amarras jurídicas, vamos organizá-lo.

PAGAMENTO:  não haverá pagamento para publicar no blog, nem ônus e nem bônus. No livro, não sabemos quem vai pagar as despesas, conversaremos em agosto.

TIPOS DE TEXTOS: não desejamos receber textos longos ou temáticos (dissertativos), preferimos os gêneros chamados literários: crônica, poemas, contos que falem de Araçatuba, com personagens locais ou cujas ações se desenvolvam em cenário local. A cidade pode ser cantada em versos em diferentes épocas ou sobre um lugar especial que caracterize-a no todo.

ENDEREÇO: antes do texto, coloque seu endereço digital: e-mail, Facebook, WhatsApp. Depois o texto.

RODAPÉ: pôr no rodapé do texto uma pequena referência ao autor. Veja exemplos no blog.

O BLOG VAI SER MAIOR QUE O LIVRO: o texto deve ser entregue no editor Word, fonte "Verdana" em forma de anexo de e-mail e não poderá ultrapassar a 3.500 caracteres incluindo na contagem os espaços entre as letras, o espaçamento entrelinhas sendo duplo. Poderá anexar também uma imagem. Primeiramente, o seu texto vai participar do blog, depois, viabilizada as condições financeiras, poderá entrar no livro também. Nós vamos conversando.

*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Membro da Academia Araçatubense de Letras. WhatsApp: 18 99786 9445. Tenho página no Facebook.

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Além do horizonte - Yara Pedro de Carvalho

Vista aérea de Araçatuba
A manhã tão fria aquecida pelo potente Sol da Noroeste como cobertor macio e fino que só abriga o corpo de uma intempérie mais “daneira” mas, com cuidado deixa passar o natural alento do começo do inverno e uma vontade de ali ficar enrolada no abrigo, quase pouco, e sentir que nem sempre o forno nosso do dia a dia precisa existir sem pausa. Lá de cima, num décimo primeiro andar ,contemplo e me maravilho com a  extensão de natureza que ainda nos cabe ao redor da nossa cidade ,mesmo já tão alterada pelo cultivo de tantas agriculturas ou pelo passo lento do gado resignado pela morte que é certa ,mais para ele que para nós, humanos, mas tão certa nos é também, embora sem tempo marcado, só sabido e não cultivado porque é tão imprevisível o modo e a hora! O gado sabe ,tenho certeza. Talvez por isto coma devagar para evitar peso certo. Antes do horizonte traçado lá na curva do globo terrestre, desde que vim para meu céu, só a relva ou a cana de açúcar e o pouco rebanho me faziam vista, até que bairros planejados aumentaram as luzes no anoitecer, trocando estrelas no céu por estrelas no chão. A arborização foi imediata e hoje quase esconde casas e outras construções de pequeno porte. Ainda é bonito de se ver e deixar o pensamento ultrapassar as barreiras do horizonte para encontrar o que eu quiser lá na frente. De um lado do apto tenho vista para o caminho certo do Tietê que risca nobremente minha telejanela de forma tão delicada que há quem duvide que é ele, o majestoso caminho dos bandeirantes. Para este mesmo lado Araçatuba se estica, abre os braços e por onde cresce, as luzes noturnas demonstram que este organismo urbano cresceu tanto que esfria os pés no limpo e largo rio Tietê. Hoje até nos abastece com toda dedicação de pai. Reclamei com a chuva que passou aos urros e uivos declarando presença já mas, namorada do vento correu com ele e caiu pro lado dele, quase longe  ou muito perto só deixando o rastro frio que me obrigou  a me abrigar na coberta improvisada. E a água do céu correu além do meu horizonte deixando para trás nuvem fina, neblina que me lembra a infância amanhecendo na fazenda da bisa Romana. E lá a jabuticabeira exibida, negrinha do chão à copa convidando minha gulodice a fazer parte da mesa posta. Alta e esguia, com sorriso aberto e pão quente saído do forno no prato, já amanteigado, ela e eu, apreciando o fruto no pé e saboreando pão e café fraquinho, só para criança. Um horizonte aquém no tempo mas tão próximo fisicamente falando. Coroados é logo ali! Quase vejo da janela do lado de lá. Ainda caminhando a passos largos , minha doce terra deixou – se fazer canavial de mais de mil .O novo preço para o Brasil caminhar sem furar o chão e poluir menos nosso ar. ETANOL e GADO no mesmo espaço não combina e a “Terra do Boi” assumiu novo papel , mudou o cheiro , mudou o horizonte  para um verde especial , fumaça fina das usinas e ainda sobrou espaço para quase ver Birigui .Tenho este privilégio de estar quase no espaço sideral e , do alto amar cada cantinho que vejo , mesmo à boa distância .É amor umbilical , quase incondicional porque não sei me calar se vejo Araçatuba machucada pelo descuido dos meus irmãos de terra ou mesmo dos que juraram que cuidariam dela. Quem veio para atrapalhar, que saia de mansinho e vá para outro lugar. Quero e exijo cuidado com todos os ipês ,  patas de vaca e tudo o mais que possa florir e refrescar nosso ar neste espaço. Não aceito podas sem capricho. Lixo?! Ou despreparo estão fora. Por onde eu passo, vigio! Façamos todos um grande laço entorno desta cidade. Crescer mais nem precisa . Já está de bom tamanho para ter menos problemas. Se a noite nos convida para um toque de violas , sanfonas ou guitarras , sejamos um pouco “cigarras” para a alegria das noites daqui .E quando o dia amanhece vá pro seu trabalho construir esperanças e certezas. Cada um tem seu ponto de vista mas, sem descuido, amemos o que é nosso. Quem ama cuida. Cuidemos de Araçatuba nem que seja aos gritos .   
 *Yara Pedro de Carvalho, musicista, escritora, atual presidenta da Academia Araçatubense de Letras

Araçatema - Cidinha Baracat


Entra, caminheiro, vem ver minha terra:
Banhada de sol e vestida de luz.
Escuta o seu canto de amor e de vida
Que a todos convida, recebe e seduz.

Minha terra é um poema sem rima nem metro
Traçado a machado por braços de aço
De um grupo de bravos, que embora sofrendo,
Confiou no triunfo e descreu do fracasso.

Minha terra é um hino de fé no progresso
Composto ao compasso de um sonho viril
Na marcha confiante, pujante, cadente,
Ao ritmo quente da voz do Brasil.

Minha terra é um momento na história da raça:
Presente que passa com passo seguro; 
Que traz do passado vigor e grandeza;
Que leva a certeza de um belo futuro.

Minha terra é um pedaço do solo paulista,
Sublime conquista na rota da glória;
Que tira um exemplo de cada tropeço,
Pois sabe sem preço o sabor da vitória.

Se em tua jornada, no tempo e no espaço,
Depois do cansaço, quiseres um dia,
Fruir a poesia de luz e vigor;
Entra, caminheiro, vê Araçatuba,
Que a todos saúda e oferece pousada,
Banhada de sol e vestida de amor!

*Maria Apparecida Godói Baracat (Cidinha Baracat) é professora, escritora, membro da Academia Araçatubense de Letras  

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Fundação da A.E.A. - Geraldo da Costa e Silva

                
Com Ernesto Castro Kohl e Carlos Alberto 
de Almeida Normanha, inauguramos a Clínica Infantil Araçatuba em 20/3/1971. Vindo de Ribeirão Preto e apaixonado por futebol, lá, após concluídas as atividades hospitalares vespertinas, assistia até aos treinos coletivos do Botafogo, com os colegas Betão, João Luís, Aer, Caretão, Guidio e Nassin. Aqui o futebol profissional estava em baixa. Existia o Araçatuba F.C., treinado por Aimoré Chiquito Ortega, que dispunha de raros jogadores de nível: Divalter, Dida e Luizinho. Assim, programava minhas atividades profissionais de modo a reservar um fim de semana de cada mês para namorar e ver o Botafogo, em Ribeirão.
               Conhecendo o Aimoré, a amizade foi imediata, pelas afinidades futebolísticas. No fim do 
ano o Araçatuba F.C. foi desativado e em 1972 o time amador do Frigorífico T. Maia foi profissionalizado, sob a coordenação de Degrossi, Jovino Cadamuro e Luizão, auxiliados pelo prestativo Ari, que gerenciava a república dos atletas. Formavam a comissão técnica, Aimoré, treinador, José Carlos Magalhães e José dos Santos Primo, preparadores físicos. Fomos convidados para compor a diretoria José Pedro Souto Aires, César Bombarda, Marcondes e eu. O E.C T. Maia disputou o campeonato paulista da segunda divisão em 1972 
com um time razoável, pois o Aimoré buscou Mão de Onça, Almeida, Cido, Sobral, Niltinho, João Carlos e 
Periquito, juntando-os a Carlos Albanesi, Quinha, Orlandinho, Pingo, Divalter e Luizinho. No final do 
ano a administração do frigorífico decidiu encerrar as atividades profissionais do clube e todos os jogadores foram dispensados. O grupo todo procurou o Aimoré 
em sua casa e a ele entregou seus atestados liberatórios, colocando nas mãos dele os seus 
destinos. Queriam jogar, de preferência em Araçatuba. O Aimoré ficou sensibilizado, procurou-me e 
resolvemos fundar um novo clube. Articulamos com José Pedro, Juraci Violato e César Bombarda uma reunião que aconteceu na sede do E.C. Corinthians a 15/12/1972.
            
A ata desta reunião está perdida. Compareceram mais de trinta esportistas, entre os quais o Dr. Habib Nadra Ghaname, Dr. Hélio Augusto Mitidieri, Dr. Ernesto Castro Kohl, Hélio Pereira de Souza, César Bombarda, Eliseu Fernandes, Jovino Cadamuro, José Pedro Souto Aires, Waldemar Cachorro, Ricardo Fernandes, 
Osvaldo Passareli... Da pauta constaram três 
assuntos: fundação da nova agremiação, denominação e eleição da diretoria. A fundação foi definida rapidamente, por unanimidade. A escolha do nome 
do novo clube foi muito debatida e trabalhosa. Houve várias propostas, entre elas Operário F.C., Comercial F.C., Sociedade Esportiva Araçatuba, Associação Esportiva Araçatuba, apresentada pelo Dr. Ernesto Castro Kohl. Waldemar Cachorro queria Comercial 
F.C., clube amador já de alguma tradição e de que era presidente. Argumentou sobre a vantagem de ter registro amador na Federação Paulista de Futebol e percebi claramente ter conseguido pelo menos oito adeptos. Operário F.C. tinha cinco votos manifestos, outras denominações dois, três votos e S.E. Araçatuba e A.E. Araçatuba dividiam preferências. Coordenando o debate, contabilizei os votos e percebi que ia dar Comercial. Então fiz a proposta estratégica de 
polarizar entre dois nomes, retirando Operário, com menor apelo, e como S.E. Araçatuba e A.E. Araçatuba eram muito semelhantes, ficar com um deles para disputar com Comercial. Aceita a proposição e 
escolhida A.E.A., por ser uma sigla mais chamativa e charmosa, fomos para a votação final. Eu falava baixinho para os amigos da mesa: - Se der Comercial, estou fora disso. Como poderia eu, sócio do Botafogo F.C. desde 1959, proprietário de cadeira cativa no Estádio Santa Cruz, ser um dos fundadores do Comercial, o Bafo de Araçatuba?
            Deu A.E.A, pela sigla e pela ostentação do nome da cidade. Voltei para casa feliz e presidente. 
Por aclamação fui eleito com José Pedro Souto Aires vice-presidente. Osvaldo Passareli foi escolhido para presidir o Conselho Deliberativo. Era 15 de dezembro 
de 1972. O mano Zacheu e sua esposa Marisa 
faziam-nos sua primeira visita. Entenderam minha ausência de duas horas para participar da reunião inadiável. Nos dias seguintes completamos o quadro 
de dirigentes: Vandervino dos Santos, o Vando, tesoureiro; Eliseu Fernandes (hoje desembargador em Rondônia), secretário; César Bombarda e Juraci 
Violato, diretores de futebol; Jovino Cadamuro, diretor do departamento amador; Dr. Habib Nadra Ghaname, diretor do departamento jurídico; Dr. José Carlos 
Ramos Rodrigues, diretor  do departamento médico.

           Assim mantivemos em Araçatuba os talentos 
de João Carlos e Periquito. Nem de material esportivo dispúnhamos para iniciar os treinamentos. 
Humildemente fomos eu e Aimoré ao frigorífico 
solicitar a doação do velho material do E.C. T.Maia. Ganhamos chuteiras usadas, bolas e meias furadas e fomos tratados com desdém por Ug M. Barbosa. Como o estádio municipal apresentasse gramado, vestiários e acomodações em mau estado de conservação e não fosse iluminado, organizamos uma comissão e solicitamos audiência a Waldir Felizola de Moraes, prefeito eleito e ainda não empossado, que nos 
recebeu em sua casa. Além dos diretores, estiveram presentes os militantes da imprensa esportiva Mituo Ishi, Levi Silva, Eduardo Dias, Heleno de Souza. Ao prefeito solicitamos reparos e iluminação do estádio, mais custeio do material esportivo por três meses, até que o clube adquirisse vida própria. Ele respondeu de modo direto: "Eu detesto futebol. Gostaria de colocar uns bois pastando naquele gramado. Se nada prometi para ser eleito, agora que sou prefeito é que nada prometo mesmo. Por que vocês, em vez de futebol, 
não vão cuidar das suas vidas?"

            Cada qual continuou cuidando da sua, naturalmente. A postura insensível e sincera do 
prefeito não arrefeceu nosso ânimo. Estávamos determinados, conhecíamos o valor do material 
humano disponível e, principalmente, sabíamos da nossa capacidade de trabalho, do nosso conhecimento da área e dos nossos limites. O povo levou fé na 
nossa empreitada. Apareceram muitos voluntários 
para a arquitetura de um corpo associativo. Dois deles tiveram grande destaque: Roberto Aoki e Durval. 
O Dr. Paulo Bombonati cedeu ao clube uma casa de 
sua propriedade, à rua Tabajaras, para a montagem 
da república dos atletas, que rapidamente se concretizou pela doação de móveis e utensílios por amigos e torcedores.

            Assim começou. Lá se vão quarenta e cinco anos. Bons e maus momentos, glórias, muitas histórias. Umas bem sabidas, outras bem sofridas, algumas nebulosas e obscuras. Guardo e conto lances da construção. Da degenaração tem mais gente pra 
contar.

***

Dr. Geraldo da Costa e Silva e o seu livro de crônicas sobre futebol

A.E.A.: registro e primeiros tempos


            Fundado o clube, tratamos de montar o time. O zagueiro Almeida, oriundo dos juniores do Palmeiras, indicou alguns amigos cujas idades estavam estourando para a categoria, provavelmente liberados pelo verdão. Aimoré foi à capital e trouxe o goleiro Álvaro e o ponta-esquerda Daércio. Da várzea paulistana teve informações e buscou o excelente volante Luís Valentim. Do futebol amador da cidade garimpamos Bauer e depois Sérgio Luís. Em Andradina buscamos o Marreta (Elói) e fizemos vir de Mineiros, Goiás, o ponta-direita Arnaldo. Depois foram chegando Tuta (Junqueirópolis), Anselmo (Prata City), Betinho (Pereira Barreto), Vicentinho (Pacaembu)... Juntados aos remanescentes do E.C. T. Maia (Quinha, Almeida, Cido, Orlandinho, Claércio, Sobral, João Carlos, Periquito e Luizinho), estava composto o elenco-base. Os contratos, numerados, assinados pela moçada foram levados pelo Eliseu Fernandes (hoje desembargador em Rondônia) para registro na Federação Paulista de Futebol e recusados: a entidade, então presidida pelo folclórico João Mendonça Falcão, não aceitava registrar como profissional um clube recém-filiado, que sequer disputara um campeonato amador. Os contratos assinados tinham prazo de validade para registro, controlados pelo número e pela data, maneira de combater os perversos contratos-de-gaveta. Assim, tivemos que refazer todos. Sucessivamente o Eliseu fez mais três tentativas junto aos cartolas federativos, sem sucesso. Nossos jogadores não tinham até então, portanto, qualquer vínculo com o clube, embora disso não soubessem. Os amistosos iam realçando as qualidades deles e o assédio de outros clubes veio em crescente. Procuramos a ajuda do deputado estadual Jorge Maluly Neto. Passamos, eu e Aimoré, um dia na Assembleia Legislativa, ele tocando seu expediente e mantendo contatos com outros parlamentares ligados ao esporte, como Ari Silva, colunista do jornal Gazeta Esportiva. No fim da tarde fomos com ele e Wadih Helu, ex-presidente do Corinthians, para a sede da Federação Paulista de Futebol, onde nos recebeu Américo Egídio Pereira, o vice de Falcão. Wadih Helu soltou o verbo exigindo a inclusão da AEA no torneio seletivo que classificaria dois clubes para a disputa do Campeonato Paulista da Divisão Especial (hoje A1). Foi dizendo que Araçatuba era uma grande cidade, com um belo estádio. O senhor Américo humildemente ia concordando, até perguntar-me qual tinha sido nossa classificação no campeonato anterior da Primeira Divisão (A2). Respondendo que não havíamos participado e sim o T. Maia, a casa caiu. Riu gostosamente, pois pedíamos o impossível. Com mais um pouco de conversa dos dois deputados, prometeu registrar nossos contratos na semana seguinte, garantindo vaga para s disputa da Primeira Divisão. Exatamente o que queríamos.
            Veio o campeonato, o time crescendo, dando espetáculos cada vez melhores no Estádio Ademar de Barros, para público e quadro associativo cada vez maiores. A história todo mundo sabe. Durante o certame perdemos apenas um jogo em Garça (3x1), jogando com dez elementos desde o início da partida. O triangular final, com o Rio Claro e o Catanduva, foi dramático e a 15/12/1973, exatamente no dia do seu primeiro aniversário, a AEA sagrava-se Campeã Paulista da Primeira Divisão.
            O vice-prefeito Dr. Oscar Luís Gurjão Cotrim tornou-se grande incentivador da rapaziada. Ia ao vesti rio nos dias de jogos, assistia a todos. At‚ o prefeito Waldir Felizola de Moraes, que detestava futebol, passou a marcar presença, procurando aparecer junto aos atletas. Quando ganhamos o campeonato a cidade vibrou, muita gente prontificou-se em colaborar para a consolidação do clube. O deputado Maluly Neto descolou verba do governo estadual para a iluminação do estádio. O processo seguiu o cronograma da Secretaria dos Esportes, a obra tornou-se realidade e depois dos testes de praxe a inauguração foi marcada para 30/10/1974. Por contrato direto com o presidente Vicente Mateus, acertamos jogo festivo com o Corinthians: CR$ 60.000,00 mais CR$ 24.000,00 pelo fretamento de avião especial, mais despesas de hotel e alimentação para a delegação. Os ingressos foram colocados à venda: CR$ 50,00 as numeradas e CR$ 20,00 as demais acomodações do estádio. A procura era grande quando o prefeito fez intervenção. Unilateralmente, sem diálogo, decretou preço único: CR$ 10,00 (dez cruzeiros). Pelo rádio dizia que o estádio era municipal, que ele tinha o poder de estabelecer o preço dos ingressos: "Sou o gerente da cidade e meu povo tem que ver o jogo" . Lembrava uma antiga música de carnaval, que falava do pedreiro Valdemar, construtor de casas e palacetes onde depois não podia entrar. Convocou-me à prefeitura, fiz-lhe as projeções demonstrativas de que sua determinação inviabilizava o evento, pelos custos, além do risco de chover. Ele manteve-se inflexível: o poder de mando era seu e palavra de prefeito não voltava atrás. Também não cedi. Na busca de respaldo e segurança, reunimos os diretores e telefonamos para Vicente Mateus, consultando-o sobre a possibilidade de cancelamento do jogo, sem multa contratual. Daquele jeito peculiar, respondeu: "É um favor que me fazem. O técnico Sílvio Pirilo ficou uma fera com a marcação deste amistoso". Com isso firmamos posição. Antes de propor ao prefeito o cancelamento, péssimo para o clube e desastroso para ele, ofereci-lhe a alternativa de fazer o jogo de portões abertos para o "seu povo", assumindo a prefeitura o contrato com o Corinthians e pagando CR$ 20.000,00 à AEA. Recusada a oferta, anunciei-lhe então a suspensão da partida: ele que inaugurasse os refletores quando, como e com quem quisesse. E fui-me. O assunto ferveu na imprensa. O Waldir, no seu estilo, esbravejou pelo rádio e eu ouvindo no meu receptor: "Esse moço aqui chegou há  pouco tempo, mal bebeu da água do Baguaçu e quer mandar na cidade. Aqui tem gerente. Ele que se vá embora".
            Fiquei. E, com a diretoria, firme no propósito assumido. Então o Dr. Cotrim entrou nas negociações, com seu amor pelo esporte e seu tino diplomático. Ia à prefeitura e vinha ao meu consultório. Eu radicalizando, mas ansioso para realizar o jogo. Fiz então uma proposta. Para que a palavra do prefeito prevalecesse, haveria, sim, ingressos de CR$ 10,00. Deveriam ser construídas duas muretas na arquibancada do lado do ginásio de esportes, delimitando entre elas metade do espaço central, onde o espectador pagaria CR$ 30,00 pelo ingresso; nos dois espaços laterais o preço seria CR$ 10,00. Para manutenção da ordem e prevenção de invasões as muretas seriam guarnecidas por atiradores do tiro de guerra. Assim o jogo aconteceu, um belo espetáculo, 2x2 no placar e as muretas ainda hoje lá estão. O lucro líquido para a AEA correspondeu a cinco folhas mensais de pagamento, apesar de o prefeito, com quem depois tive convivência pacífica e cordial, e que sempre respeitei pela honestidade na gestão administrativa, ter dado o seu revide: distribuiu centenas de ingressos gratuitos.
            A expectativa pelo jogo foi demais, na cidade e região, não só pelo imbróglio, mas pela presença do Corinthians. A chegada do timão levou muita gente ao aeroporto. Vicente Mateus veio comigo no Karman Ghia TC azul e chegamos à frente. A delegação veio de ônibus e do apartamento do presidente observávamos uma multidão cercando o ônibus na frente do Hotel Chamonix. Os jogadores iam entrando e lá de cima eu assistindo torcedores subindo e afundando o teto do meu carro novo, para melhor visão de seus ídolos.
            No jogo, Daércio deu um baile em Zé Maria, titular da seleção brasileira. Vicente Mateus, vendo o jogo comigo, ficou deslumbrado, quis comprar seu passe antes do fim da partida. Sugeri conversarmos durante o jantar, na Churrascaria Gaúcha. Lá  acertamos o negócio: CR$ 50.000,00 mais um novo jogo do Corinthians em Araçatuba. Conversei muito com o folclórico dirigente, pessoa boníssima e de simplicidade cativante. Perguntei-lhe : - Como o senhor administra o Corinthians? Ele respondeu: "Simplesmente. Qualquer diretor que fizer gasto maior que CR$ 100,00, sem meu consentimento, paga a conta". Findo o jantar, Vicente Mateus, então com 70 anos, quis ir ás mulheres. Uma caravana seguiu para o trevo. Eu levando-o no Karman Ghia. Entramos numa casa, ele engraçou-se com uma loira de estatura bem superior à sua. Despedi-me e fui para casa. Imagine um pediatra casado, em início de carreira, brigando com o prefeito, dando banda na zona com Vicente Mateus!

*Geraldo da Costa e Silva é médico, escritor, membro da Academia Araçatubense de Letras